sábado, 9 de janeiro de 2010

Tua presença em mim

Não tenho memória de quando você nasceu, pois chegou bem antes de mim.
Mas imagino, a alegria do nosso pai que tanto queria um menino, um homem.
Contam que você nasceu robusto, lindo, de causar inveja.
Dizem que você foi motivo de muita alegria quando nesse mundo chegou.


Eu não.
Nasci menina, fraquinha, frágil e motivo de decepção.
Entre nós havia uma irmã mais velha que eu e obviamente mais nova você.


Crescemos juntos numa probreza de dar pena. Lembra?
Em nossa casa faltava tudo, exceto pancada. Isso sobrava.
Não fosse tudo isso, poderiamos juntos sermos  muito felizes. Lembra? Eramos companheiros, corriamos pelo mato, nadavamos, caçavamos, desfrutavamos dos frutos que as árvores nos davam.
Bons momentos...
Quantas vezes choramos impotentes vendo outras pessoas de nossa familia apanharem de nosso pai.
Deus... quantas vezes...


Mas, o tempo passou e você cresceu meu amado irmão, e ficou adolescente.
Você era lindo.
Nossa situação melhorou, de miseráveis tinhamos mudado para pobres.
Mas você era cobrado. Lembra? Afinal você era o homem tão esperado.


Haviam ai na minha ótica dois erros:
A cobrança desmedida e o outro, a  liberdade que te deram por ser homem, mas para um adolescente recém chegado a cidade vindo do sítio.


Você era criança frente a cidade grande e não sabia.
Desfrutou dessa liberdade sem medida.
Irmão, como te admirava...


Porém,
Chegou para você o preço da cidade grande.
Chegou o cigarro, veio a bebida e depois vieram as drogas.


Ai, vieram junto as brigas e brigas com nosso pai.
Lembra meu querido?
Aquele vai e vem. Vou embora volto, e vou de novo...


Então... na sequência do tempo, o purgatório virou inferno.
Você se envolveu com a justiça e foi detido pela primeira vez.
Ai teve a segunda.


Que dor, que tristeza foi ver meu irmão tão lindo se decompondo dia a dia...
Você não imagina o quanto lutei para te salvar, o quanto te defendi, enfrentei tudo e todos e até nossa familia e nosso pai em tua defesa.
Mas foi em vão


Sabe meu irmão, muitas vezes cansava. Foram anos, e muitos.
Houveram vezes que quis desistir de você.
Cheguei a achar que te odiava mesmo te amando.


Até que aquilo no que você tinha se transformado, um farrapo humano, já sofrendo convulsões pelo alcoolismo, sofreu uma queda e fraturou o crânio. Lembra?
Para todos que olhavam sem te conhecer, viam um indigente. Assim, não teve o devido socorro, pois aqui no Brasil indigentes são nada.


Porém, mais uma vez, lutei por você.
Para te salvarem. Não admiti que te tratassem com desdém.
Você não era qualquer um, era meu irmão.
Que força eu tive.... Você deveria ter visto.


Só faltou e era a verdade, dizer para os médicos e enfermeiros que te desdenhavam: Alí, existe um garoto lindo. Ele é meu irmão. 
Eles nem imaginavam que alguém se importasse.


Mas querido,
Chegou o dia da tua partida.
Você foi, e encontrou finalmente paz.


Me doi até hoje e sinto um gosto amargo na boca por não ter conseguido te salvar do alcool e consequentemente da tua morte.
Pena meu lindo,
Não participei da tua chegada,
Mas estive presente na tristeza da tua partida.


Vai com deus Garoto!
E me espera.
Você sempre estará em mim.

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